quarta-feira, 24 de julho de 2013

Por que a virgindade feminina é tão valorizada?

Brasileira leiloa sua primeira noite de sexo e lances ultrapassam meio milhão de reais, enquanto homem que participa do mesmo projeto tem proposta máxima de R$ 3 mil

Danielle Nordi - iG

Uma brasileira de 20 anos ganhou as manchetes quando veio à tona o curioso projeto do qual está participando. Catarina Migliorini está leiloando a sua virgindade através de uma produtora australiana, para um documentário intitulado “Virgins Wanted”. Além de Catarina, também participa do projeto o russo Alexander Stepanov, de 21 anos. Enquanto interessados por uma noite com Catarina se propõem a pagar o equivalente a mais de meio milhão de reais, os lances feitos pela virgindade de Alexander não ultrapassavam R$ 3 mil. Por que os valores são tão diferentes?


Reprodução/Virgins Wanted
Alexander e Catarina: o lance oferecido para ela é quase 200 vezes maior que o dele


A antropóloga Mirian Goldenberg acredita que o simbolismo da virgindade feminina tem ainda forte influência na sociedade. “O homem, quando desvirginado, não perde nada. A mulher perde, mesmo que seja um pedaço minúsculo de pele. Esse pedaço simboliza algo importante, o fato dela nunca ter sido possuída por ninguém”, afirma.

Historicamente a virgindade feminina sempre teve um valor alto, não necessariamente monetário. Há não muito tempo, se a mulher não fosse mais virgem, não servia para casar e poderia até perder o convívio com a família. Mesmo em muitas sociedades que avançaram no conceito de igualdade entre homens e mulheres, a virgindade feminina mantém seu status de preciosidade.


“Vivemos em uma cultura patriarcal que está perdendo suas bases, mas ainda existe. A questão da virgindade sempre foi usada como se fosse algo precioso e ainda é vista dessa maneira por muita gente”, diz a psicanalista e escritora, autora de “O Livro do Amor” (Ed. Best Seller) Regina Navarro Lins.

Ao contrário da brasileira que concordou em colocar um preço na sua virgindade, a funkeira Valesca Popozuda, conhecida por cantar letras eróticas e afirmativas do prazer feminino, acredita que é impossível chegar a um valor. “A virgindade é importante para quem tem. Não tem preço”.

“O escolhido”

Mesmo que a importância da virgindade feminina seja um consenso entre especialistas, um aspecto do leilão não pode ser ignorado: a participação ativa da mídia em divulgar o valor da transa a cada lance dado. “Será que alguém pagaria R$ 500 mil para desvirginar uma mulher se não fosse um evento público, disseminado nas redes sociais? Alguém pagaria isso se apenas o homem e a mulher soubessem? A resposta provavelmente seria ‘não’”, afirma a sexóloga Walkíria Fernandes.

O desejo do homem de tirar a virgindade de uma mulher também pode ser impulsionado por motivos bem mais práticos. “Transar com uma virgem pode significar que esse homem está isento de ter o seu desempenho sexual comparado ao de outros homens, já que ela, por ser virgem, não tem nenhuma referência da atuação sexual de outro homem. Além disso, ser o primeiro homem na vida sexual de uma mulher faz com que ele se sinta privilegiado por ter sido ‘o escolhido’”, completa Walkíria.

Se para a mulher a virgindade não é motivo de constrangimento, para o homem é diferente. A diferença entre os valores pelo mesmo “produto” no leilão de virgindade nada mais é do que um reflexo do que se espera dos dois gêneros entre quatro paredes.

De acordo com Walkíria, vivemos um duplo padrão de educação sexual. “O homem é educado para ser o garanhão e a mulher para ser apenas de um ou de poucos homens. Quanto mais a mulher se resguardar, mais será valorizada. Quanto mais experiências sexuais um homem tiver, mais macho ele será.”

“Se a mulher é valorizada pelo não conhecimento de uma vida sexual, o homem é muito mais cobiçado pela experiência que tem e não pela falta dela. Quantas mulheres gostariam de transar com um virgem?”, indaga a terapeuta sexual Luciane Secco.

Valesca se exclui. “Não tenho essa tara de ensinar. Acho que a transa deve ser como ir a um parque de diversões e isso só pode acontecer se os dois tiverem experiência”, diz.

Críticas

Enfrentando críticas severas, principalmente em grupos de discussão em redes sociais, a brasileira parece determinada a fechar negócio. Nem todos aceitam que a virgindade possa ser tratada como um “produto”, conferindo a seu dono a liberdade de vender ou dar para quem desejar. “Por mais que as mentalidades mudem ao longo do tempo, sexo ainda é tabu. O moralismo existe. As mulheres foram condicionadas a ver sexo só acompanhado de amor”, aponta Regina.

“Ainda existe essa ideia de que para as mulheres sexo e amor são coisas inseparáveis. Você não vende sexo, é como você se vender por inteira. Enquanto que para os homens é possível pensar que sexo e amor são coisas separadas. Quando eles traem, podem alegar que foi só sexo, mas como sabem que as mulheres pensam de outra forma, não aceitam a mesma justificativa quando elas a usam”, explica Mirian Goldenberg.

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