quinta-feira, 25 de julho de 2013

É inviável barrar espionagem de internet dos EUA, diz ex-analista



RUBENS VALENTE

É uma tarefa "impossível" para o Brasil conseguir impedir uma espionagem de telecomunicações como feita pelos EUA e só resta ao país investir na proteção do conhecimento sensível nas mãos do Estado, dos cientistas e das empresas de áreas estratégicas, segundo o ex-analista de inteligência Jorge Bessa.

Ele foi chefe do setor de contraespionagem e coordenador nacional de contrainteligência da SSI (Subsecretaria de Inteligência), antecessora da Abin.

"É impossível impedir porque, desde que o mundo é mundo, o grande fator da espionagem é o avanço tecnológico. Assim foi todo o tempo. Quem desenvolve a tecnologia é que vai dominar", disse Bessa, para quem os esforços feitos no Brasil em contraespionagem "não chegam nem perto da realidade dos serviços de inteligência americanos".

"Não dá para comparar, não dá para competir".

Autor de "A Contra-Espionagem Brasileira na Guerra Fria" (Thesaurus, 2009), Bessa trabalhou por 25 anos no serviço de inteligência brasileiro, de 1973 a 1998, passando por sete governos civis e militares, do SNI (Serviço Nacional de Informações) à SSI.

Ele vê com grandes reservas as promessas do governo brasileiro de que pretende mobilizar a atenção de foros internacionais para cobrar a paralisação da espionagem.

Citou como exemplo a investigação do Parlamento Europeu sobre o programa Echelon, um sistema de interceptação de telecomunicações bancado pelos EUA e descoberto no final dos anos 90.

"O governo pode reclamar. O Parlamento Europeu, no caso do Echelon, propugnou medidas e nada aconteceu. É só jogo de cena. Porque vai continuar a ser feito", disse.

"Todo mundo tem que saber que diuturnamente alguém está querendo espionar, se eu sou detentor de conhecimento secreto, sigiloso, de cunho estratégico", afirmou o ex-analista.

Nos anos 90, Bessa ajudou a formatar o que o governo brasileiro hoje chama de programa nacional de proteção do conhecimento sensível. Tratou-se de um trabalho de alerta e preparação de empresas, cientistas e universidades para saber lidar com seus segredos que pudessem despertar a cobiça estrangeira.

RESISTÊNCIA

A princípio, segundo Bessa, houve muita resistência, mas depois deu-se razão ao serviço de inteligência do Planalto, à medida em que os pesquisadores começaram a saber que alguns avanços brasileiros, principalmente na agricultura, eram replicados em países estrangeiros.

O ex-analista disse que o serviço de inteligência brasileira "não tinha dúvida" sobre interceptação de telefonemas e outras trocas de informação entre pessoas do alto escalão do governo, o que deu origem ao esforço pioneiro de se criar uma criptografia nacional de alto padrão.

O governo militar então criou, no final dos anos 70, a estatal Prólogo, embrião do Cepesc (Centro de Pesquisas e Desenvolvimento para a Segurança das Comunicações), hoje vinculado à Abin.

O principal objetivo da Prólogo e do Cepesc foi dotar as comunicações das altas autoridades e do próprio SNI de uma criptografia potente.

"Como fazem os serviços de inteligência decentes, [o governo] foi buscar os melhores cérebros das universidade na área de matemática e montou uma equipe de primeira qualidade para fugir da dependência total no campo das comunicações", contou.
Folha de  S. Paulo

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